História

Situada no topo da vasta colina, possivelmente local de agreste vegetação, Abraveses dominava uma área extensa cujos horizontes iam das proximidades de São João da Carreira à Ponte da Azenha. A sul, seguindo quase sempre o leito do Pavia; a poente, subindo o Monte Salvado até ao cume de um dos outeiros da Serra do Crasto a oeste, de Pascoal (com ligeiro desvio por entre terras de Santo Estêvão e Quintela); e, finalmente, no sentido leste, até ao enorme monte granítico de Santa Luzia.

Do Marcão, outrora levantado, algures a nascente da capela, até outro que existiu no alto da Cumieira, estendia-se a linha divisória entre Campo e Abraveses, esta infletia para nordeste, até encontrar o ribeiro, um pouco além do Alto do Pintor. Daqui, por entre terras de Moure de Madalena e de Bassar (Campo), espraiavam-se as de Moure de Carvalhal, até atingirem, a norte, terras de Folgosa. Alcançada parte dos terrenos da pista do Campo de Aviação, voltava para nascente e, seguindo, no sentido sul, surgia uma nova linha divisória, pelas encostas e valeiros da Ribeira do Carvalhal até próximo da Quinta do Salgueiro, onde uma pequena linha de água fazia a separação das freguesias de Mundão e Rio de Loba.

Nesta grande área nasceram e cresceram povoações muito bem delimitadas que hoje, dado o crescimento urbanístico e exigências da civilização, não é possível bem definir e demarcar.

A freguesia de Abraveses, em final do século XIX, era constituída pelas povoações de Pascoal, Moure de Carvalhal, Póvoa, Esculca, Santiago, Aguieira, Santo Estêvão e Abraveses, ao centro. Além destas povoações, muitas e importantes quintas existiam, as quais, por dificuldades de amanho e cultivo, e dado a sua posição e excelente exposição, deram lugar ao nascimento e desenvolvimento de novos bairros populacionais.

O retrato topográfico da freguesia dá um traçado muito irregular, para o que basta olhar a sua implantação entre os territórios das freguesias de Mundão, Campo e Lordosa. Todavia, no que tocava à sua delimitação com a ex-freguesia Oriental, hoje São José, e, situando-se a freguesia a norte do Pavia, que irriga terras de Esculca e Santiago, servisse de linha divisória, ao chegar à confluência com a ribeira de Santiago ou talvez Pintor. Essa linha infletia, bruscamente para o interior (norte) até junto da Casa das Águias, seguindo depois pela Rua do Picadeiro e, através dos quintais e Cava, atingia o «marco» existente outrora no recanto triangular, frente à Casa da Parreira. Daqui, igualmente por quintais, é atravessado o terreno da ex-estação do caminho-de-ferro até atingir o leito do Pavia, junto às poldras, frente ao velho lagar de azeite, retomando, então, o leito normal do rio até à Ponte da Azenha, onde, à direita, existia outro grande moinho.

A vida do povo de Abraveses e terras limítrofes passa despercebida aos olhos de suas gentes, com o decorrer dos tempos, durante muitos séculos. Grande parte da área territorial da margem direita do Pavia até aos circundantes Montes de Santa Luzia e Castro fora pertença do Cabido da Sé de Viseu e de nobres fidalgos que se haviam distinguido nas lutas contra a moirama da Península ou, bastantes anos mais tarde, nas praças mouras do norte de África.

Por volta de 1807, governando o bispado D. Francisco Monteiro Pereira de Azevedo, Abraveses recebe o título de paróquia do Aro de Viseu, no entanto, com atribuições espirituais limitadas. Esta situação orientada por um “Cura”, sujeito à paróquia Oriental, durou cerca de oitenta anos. Depois de visitar o bispado e verificando que a sua área e situação demográfica, distribuída por cinco arciprestados, era demasiado vasta foi criada uma nova divisão territorial. Assim, dos anteriores cinco arciprestados passaram a dezasseis, obtidos pelo desmembramento de cada um em vários outros. O Aro, paróquias à volta da sede, é dividido em cinco novos arciprestados urbanos e suburbanos. Ao arciprestado urbano de Viseu pertenciam as paróquias da cidade: Oriental e Ocidental.

Por razão da extensão, realidades demográficas e incapacidades dos párocos da Sé (sede das duas paróquias com orago único, Nossa Senhora da Assunção ou do Altar Mor) em satisfazer as necessidades paroquiais, foram criados cinco curatos não totalmente independentes. Estavam neste caso o curato de Abraveses, bem como o de Orgens, dependentes do pároco da freguesia Oriental, enquanto São Salvador, Ranhados e Rio de Loba estavam ligados à freguesia Ocidental.

Os curatos, durante bastantes anos gozaram de autonomia relativa, pois, não lhes era permitido celebrar casamentos e batizados, prerrogativas das duas freguesias da Sé. Só por volta do ano de 1889, Abraveses e os outros quatro curatos alcançaram total independência a nível eclesiástico e, apenas, no ano seguinte, no campo civil e administrativo. É, assim, que em 30 de novembro de 1890, Abraveses alcança a sua total independência administrativa. Era sua extensão quase toda a área territorial que se estendia da “Serra da Mina”, a nascente; da margem direita do Pavia, a sul; do Monte de Salvado e Castro, a poente; de Santa Luzia e planalto da Muna, a norte. Nesta área encontravam-se, ao tempo, as povoações da Esculca, Santiago, Póvoa, Aguieira, Santo Estêvão, Pascoal, Moure de Carvalhal e ao centro Abraveses. Quintas de alguma importância situavam-se dentro desta área o que, de algum modo, se relaciona com a evolução socioeconómica da freguesia, nos tempos atuais. Foram de alguma importância as quintas do Pintor, onde dizem ter nascido Vasco Fernandes, o célebre pintor Grão Vasco, a de Santo Estêvão, de que foi dono o cónego Pêro Gomes de Abreu, cerca de 1400, terras do Conde Loureiro,em Abraveses. Na Póvoafiguravam os fidalgos da Vila Chã de Sá e em Moure de Carvalhal pontificavam os Barreiros, os fidalgos da Prebenda e de Figueiró.

Era, ao tempo, bispo de Viseu, D.José DiasCorreia de Carvalho, que governara a diocese de1883 a1911, ano que faleceu. No curto espaço de tempo em que esteve à frente dos destinos da diocese, teve ocasião de fazer visita pastoral a Abraveses em 8/6/1887, talvez a primeira na vida da paróquia, sendo o seu pároco o PadreJoaquim RodriguesBarroco.

Ao longo do tempo, que mediou entre o bispado de D. Francisco M.P. de Azevedo e o bispado de D.José DiasCorreia de Carvalho (cerca de 90 anos) a diocese foi servida e orientada por muitos outros prelados, alguns de grande nome e projeção, nomeadamente, no campo literário e religioso, como D. Francisco Alexandre Lobo, ou, por exemplo, D.António AlvesMartins, que ocupou nas lides religiosas e políticas os mais altos cargos.

Pouco, ou quase nada, se sabe como era exercida a atividade dos padres (meio-cura) em cada um dos Curatos. Somente chegou até nós que os seus rendimentos eram tão parcos a ponto de serem diretamente subsidiados pelos rendimentos da Mitra.

No que respeita às suas funções, para além da assistência espiritual e moral aos enfermos e celebração do culto divino, os padres, só a partir de meados de 1857, passaram a ter a seu cargo a escrituração do “Livro dos Mortos”, onde começaram a ser registados os nomes dos que na paróquia faleciam e do lugar onde foram sepultados, como consta de assentos feitos pelo cura, Padre BernardinoJosé Loureirode Magalhães.

Ao tempo, e até finais de 1866, os finados eram sepultados no adro ou corpo das igrejas e capelas, passando, após a implementação e viabilização da Lei dos Cemitérios, de setembro de 1835, à obrigatoriedade de enterramentos no “campo santo”, os atuais cemitérios. A mudança de lugares implicara uma alteração profunda nos costumes: trocar um lugar sagrado por um lugar fora do povoado, “um espaço desnudado e profano”, não era fácil de aceitar e, daí, a dificuldade, no espaço e no tempo, em dar plena execução ao que a lei determinava. Era, no entanto, necessário cumprir a decisão dos finados serem escriturados nos livros da própria freguesia. É, assim, que na cidade de Viseu, foi criado no ano de 1856, o primeiro cemitério onde viriam a ser enterrados os habitantes das duas paróquias: Oriental e Ocidental. Às restantes paróquias, urbanas e rústicas, cabiam, gradualmente e dentro das capacidades das autarquias, irem criando os seus próprios cemitérios, como veio a verificar-se na povoação de Abraveses, em 1866, sendo o seu pároco o Padre Feliz José Ferreira. Ao cemitério de Abraveses seguiu-se a construção dos cemitérios de Moure de Carvalhal e Santiago, este no outeiro entre Esculca e aquela povoação. Datam de 27/10/1866, de 12/12/1866 e de 11/03/1867 os primeiros enterramentos, respetivamente, no “campo santo” de Abraveses, Moure de Carvalhal e Esculca/Santiago, sendo cura o Padre Feliz José Ferreira.

Após 1886 até 1911 pouco mais foi possível saber acerca desta freguesia, o que parece ter sido dificuldade generalizada em todo o País.

No período revolucionário do Liberalismo e Anticlericalismo, com ataques aos bens da igreja, não terão passado ilesos os cartórios das jovens paróquias. Para além, da escrituração obrigatória do “Livro de Baptismos”, do “Livro de Casamentos” e do “Livro de Óbitos”, uma vez que o “Liber Status Animarum” ia caindo no esquecimento, nada mais consta.

Sobre esta época, do pouco que possamos escrever, basear-nos-emos no que a tradição oral trouxe até nós ou na legislação geral do País. Lamentamos, sobretudo, que pouco ou nada se saiba, por exemplo, acerca da edificação da actual Igreja Matriz, qual o destino dado à velha capela, que a tradição diz ter existido e com que dinheiros foi possível fazê-lo. Somente sabemos que foi edificada por partes e o nome dos poucos que nela despenderam significativos subsídios, como o parecem testemunhar certos escritos. D.José DiasCorreia de Carvalho, em 1887, referia que “o templo estava suficientemente decente, mas que havendo sofrido um acrescentamento do lado poente no corpo da igreja, cuja necessidade mostrámos dever ser reparada….” Julgamos, pois, que dadas as boas vontades e o espírito religioso das gentes destas terras no culto sempre vivo a Nossa Senhora dos Prazeres, da Esperança, dos Remédios ou das Candeias, tal obra foi levada a efeito tendo de “servir-se com a prata da casa”, como o citado bispo muito veladamente aconselhava. Desde então até finais de 1931, altura em que à paróquia foram retirados todos os direitos de autonomia religiosa (excomunhão), a Igreja de Abraveses não sofreu qualquer alteração significativa.

Por volta de 1935, é, felizmente, restaurada a atividade religiosa nesta freguesia, procurando, a partir daí, os seus párocos, para além da função pastoral, colmatar algumas das muitas faltas e deficiências notadas ou enfrentar novas situações, contando sempre com a leal colaboração dos seus paroquianos. Assim, com o Padre Laranjeira, é entronizada, na Igreja Matriz, a imagem e o culto de Nossa Senhora de Fátima, a primeira a ser venerada na diocese. Com o Padre Afonso de Paiva, é levantado o belíssimo e invulgar Cruzeiro da Independência e posto a funcionar, com marcação, em gigantescos e bem trabalhados mostradores, no alto da torre, as horas de um relógio, obra do mestre Nelas. Além das referidas obras, foi possível realizar a eletrificação da Igreja, lançar a construção da Residência Paroquial e do Salão de Festas que, infelizmente, foi impedido de concretizar. 

A atual freguesia, amputada no seu leito nascente, bem como do sul e poente, pela criação e ocupação territorial administrativa e religiosa da freguesia de São José, viu, significativamente, diminuída a sua ação no campo territorial e em termos demográficos e culturais.

Após a aplicação do Decreto-Lei nº 42040, deixaram de pertencer a Abraveses a quase totalidade de Santiago, Esculca, parcela importante da Póvoa (Cava), Aguieira, Azenha, a maior parte da Estrada Velha (antiga via Romana), grande parte da Quinta da Bela Vista e quase a totalidade da Avenida da Bélgica. Contudo, estas amputações foram compensadas, não em área territorial, mas em rápido crescimento demográfico, com a implantação de novos bairros como Santo Estêvão, Maninho, Pais da Costa, Santa Luzia (Ribeira de Mide), Baralha, Barrosa, Bairro do Vale (Organop), Santa Rita, fundo da Barroca, parte de São João das Lameiras e um invulgar crescimento das povoações existentes.

Pela Lei nº 87/97 da Assembleia da República, de julho de1997, afreguesia de Abraveses foi elevada à categoria de Vila. Dado o seu desenvolvimento e progresso social, Abraveses, satisfazia todos os requisitos impostos pela Lei nº 53/91, de 7 de agosto de 1991.

 

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